Entre desafios e avanços, como a regulamentação brasileira fortalece a aliança climática?

Os impactos globais das saídas da aliança climática e o papel do Brasil na transição sustentável.

A recente saída de bancos americanos – Bank of America (BofA), Citi, Goldman Sachs e Wells Fargo – da NetZero Banking Alliance reacendeu o debate sobre o papel do setor financeiro na luta contra as mudanças climáticas. Em entrevista ao Climate Finance Hub Brasil, Linda Murasawa, líder de Engajamento do Setor Financeiro, analisou os impactos dessa decisão no cenário global, as estratégias de regulamentação no Brasil e as oportunidades para impulsionar a transição para uma economia de baixo carbono.

O que é a NetZero Banking Alliance?

Lançada durante a COP26 em Glasgow como parte da GFANZ (Glasgow Financial Alliance for Net Zero), a NetZero Banking Alliance tem como objetivo alinhar e padronizar as ações climáticas dos bancos em todo o mundo, incluindo a limitação de financiamentos e investimentos em indústrias responsáveis por altas emissões de gases de efeito estufa.

A GFANZ é uma iniciativa ampla que reúne instituições financeiras comprometidas em alinhar suas carteiras de investimentos e financiamentos à meta de emissões líquidas zero até 2050. Além da NetZero Banking Alliance, a GFANZ inclui outras coalizões importantes, como Net Zero Asset Managers Initiative; Net Zero Asset Owner Alliance; Net Zero Insurance Alliance; Net Zero Financial Service Providers Alliance; e Net Zero Investment Consultants Initiative.

O que significa a saída dos bancos americanos da aliança?

Apesar da saída de grandes bancos americanos, a NetZero Banking Alliance ainda conta com 141 instituições de 44 países, cujos ativos somados ultrapassam 60 trilhões de dólares. Mais de 100 desses bancos já estabeleceram metas claras para descarbonização.

A saída dos bancos americanos é, sem dúvida, relevante, mas o restante do mundo segue comprometido com a urgência climática. Nos comunicados oficiais, os bancos que deixaram a NetZero Banking Alliance destacaram que continuarão engajados nas questões climáticas, mantendo metas de descarbonização e ações relacionadas ao clima. O compromisso persiste através de políticas climáticas dos estados e compromissos empresariais, mesmo diante da pressão política exercida por republicanos e também pela corte de justiça do Texas.

As instituições não podem negar que os Estados Unidos enfrentam, de forma crescente, eventos climáticos extremos. Exemplos recentes incluem os incêndios devastadores na Califórnia, onde a maior empresa de seguros do estado deixou de oferecer novas apólices residenciais, e o aumento dos custos de seguros residenciais na Flórida devido a tufões e furacões e inundações. Esses eventos extremos causam perdas e custos elevados que precisam ser levados em conta.

No âmbito de mercado, a saída de bancos americanos da aliança representa um retrocesso. Um exemplo, são as declarações de Trump sobre a retirada de incentivos para a aquisição de veículos elétricos por parte da população. Essa postura pode reduzir a competitividade dos Estados Unidos no mercado de veículos elétricos em relação à China, que lidera em energias renováveis e tecnologias de baixo carbono. Parece contraditório uma vez que empresas americanas como Tesla, do aliado de Trump – Elon Musk, além de Ford e GM, podem perder competitividade. 

A saída dos bancos americanos ressalta as tensões entre políticas climáticas e interesses políticos internos nos Estados Unidos, mas também destaca a resiliência global na busca por soluções sustentáveis.

Como a regulamentação bancária brasileira garante o financiamento da transição climática?

O Brasil, como signatário do Acordo de Paris, tem assumido compromissos significativos para a redução das emissões de gases de efeito estufa e para a promoção de uma economia de baixo carbono.

O Banco ABN Real, onde tive a oportunidade de introduzir a sustentabilidade nos negócios,  foi pioneiro ao incorporar a sustentabilidade em suas políticas de financiamento no Brasil, ainda no início do século em  2001. Ele implementou práticas como a avaliação de riscos socioambientais nos projetos financiados e o desenvolvimento de produtos financeiros voltados para energias renováveis e eficiência energética, entre outros. Essas iniciativas não apenas minimizaram riscos, mas também impulsionaram a adoção de soluções sustentáveis em diversos setores até os dias de hoje.

O Banco Central (BC) também se destaca por estabelecer normas que incorporam critérios ambientais, sociais e de governança (ESG) no sistema financeiro, contribuindo para um ambiente regulatório que incentiva investimentos sustentáveis, onde tivemos a 1ª resolução socioambiental, em 2014. A  Resolução BC 4.943, vigente desde setembro de 2021, exige que as instituições financeiras considerem riscos socioambientais em sua gestão de riscos promovendo maior segurança e transparência.

Para alavancar essa transição, a regulamentação bancária brasileira desempenha um papel crucial ao criar condições para financiar iniciativas sustentáveis e inovadoras em setores como bioeconomia, biocombustíveis e agricultura de baixo carbono.

Estratégia e colaboração pública e privada

A transição climática exige planejamento estratégico, políticas públicas eficazes e parcerias robustas entre os setores público e privado. Embora o Brasil tenha uma infraestrutura financeira capaz de apoiar projetos de longo prazo, com horizonte de 10 a 20 anos, desafios como instabilidade fiscal e cambial ainda limitam sua atratividade para investidores estrangeiros. A transparência e a adoção de metodologias que demonstrem os riscos da transição climática são essenciais para superar essas barreiras.

A transição para uma economia de baixo carbono exige não apenas uma mudança nos métodos de produção, mas também investimentos significativos em infraestrutura e tecnologia.

Iniciativas como o Climate Finance Hub também desempenham um papel importante com o suporte de modelos e metodologias que demonstram os riscos associados à transição climática e indicam em que velocidade que as empresas brasileiras estão conseguindo realizar.

Oportunidades em meio aos riscos

A bioeconomia brasileira oferece um vasto campo para o desenvolvimento de produtos e serviços que aliam sustentabilidade à geração de valor econômico.Um exemplo de sucesso é o uso do etanol como combustível alternativo, que posicionou o Brasil como referência global de biocombustíveis, e temos ainda a oportunidade do hidrogênio verde. 

Além disso, iniciativas como a Operação Inovadora de Câmbio, em parceria com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o BNDES, estão sendo estruturadas para mitigar riscos financeiros e atrair investimentos externos. Esses esforços visam fortalecer a capacidade das empresas brasileiras de implementar modelos sustentáveis e ampliar seu acesso a créditos internacionais.

Embora os desafios sejam significativos, o Brasil está bem posicionado para transformar riscos em oportunidades, liderando a transição para uma economia de baixo carbono.

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